Da redação, no Rio de Janeiro (RJ) – 03.04.2019
Três Olimpíadas, campeã do Circuito Mundial, do World Tour Finals, quatro vezes campeã brasileira. Talita conquistou diversos títulos na carreira, mas o maior troféu veio em 2018, quando estava longe das areias. O filho Renato foi a realização do sonho de ser mãe. Em entrevista ao site da CBV, a sul-mato-grossense revela como decidiu disputar mais uma corrida olímpica, os desafios em conciliar a maternidade e o alto rendimento e muito mais.
Do início, em que foi convencida a trocar o voleibol de quadra pela praia, passando pelo sonho de jogar ao lado de Jackie, e o não realizado, de atuar com Shelda, Talita faz um balanço da trajetória. Desde o retorno às areias, no final de 2018, já conquistou dois bronzes, já levou Renatinho ao pódio, mas quer muito mais na retomada do time com Taiana.
– Como foi voltar a jogar após ser mãe? Quais os principais desafios?
Foi uma experiência incrível, o primeiro torneio será algo que sempre vou lembrar, especialmente por ter sido em Campo Grande (MS). Tornou tudo ainda mais especial do que já seria, com meus familiares por perto, no meu estado. Ter o Renatinho junto comigo muda tudo. É uma emoção, um sentimento indescritível. As dificuldades são a divisão do papel de mãe e atleta. Sempre fui apenas atleta, e quando ele nasceu, tive essa mudança de foco. O coração de mãe fala mais alto muitas vezes. Horários, a preocupação para saber se ele está bem, a retomada da forma física. São coisas que a gente vai aprendendo, mas sobra motivação para encarar tudo isso. É um momento maravilhoso.
– E o reencontro com a Taiana, qual a importância dela neste processo?
Ela foi fundamental, pois eu tinha sido mãe, estava sem jogar e as dificuldades seriam naturais. Ter uma parceira que me entende, que me dá suporte. Ela compreendeu que eu teria que encontrar novamente meu ritmo, que meus horários durante um tempo seriam divididos. E é a retomada de uma parceria que deu muito certo. Construímos uma história, fomos campeãs do Circuito Mundial, do Superpraia, tivemos um caminho muito bacana.
– Como foi o planejamento para ser mãe?
Já planejava há anos, sou muito organizada nessa parte. O Renato (marido) sempre falou que tinha esse sonho também. Depois de Londres, os Jogos Olímpicos no Rio, por serem no Brasil, se tornaram meu objetivo principal. Estava disposta a tudo para me classificar, mudei para Fortaleza, fiz o que era preciso. Então adiei, fui empurrando mais para frente. E quando vi, os quatro anos tinham voado. Ao final de 2016, a Larissa disse que gostaria de jogar o Campeonato Mundial, no ano seguinte, foi mais um tempo para pesar as coisas, decidir. E fomos bronze. Não poderia ter sido melhor, tudo aconteceu no tempo perfeito.
– E disputar mais um ciclo olímpico também estava nos planos?
Não planejei jogar mais, tinha minhas dúvidas, não sabia como meu corpo reagiria, se conseguiria ter tempo para entrar na disputa. Mas minha gravidez foi muito tranquila, fui para a academia dois dias antes do Renatinho nascer. Tudo foi conspirando, fui deixando para ver meus sentimentos. E fui clara com a Taiana quando conversamos sobre retomar a dupla. Disse que não sabia se o corpo iria permitir lutarmos por essa classificação. Mas dia após dia fomos evoluindo, os resultados vieram rápido. Ainda vejo que vou crescer, sei que estou cada vez mais próxima de alcançar a forma e o ritmo de jogo que tinha antes da gravidez.
– Como foi a decisão de deixar o voleibol de quadra e se tornar uma atleta de praia? Quando se deu conta que poderia ser uma atleta de alto nível?
Fui para Maceió jogar voleibol de quadra, era central, mas era relativamente baixa para minha posição. Mesmo assim, não tomei essa decisão sozinha. Toroca (presidente da CBV e então presidente da Federação Alagoana) me deu um choque de realidade. Ele disse: ‘Você é uma boa jogadora. Mas existe uma fila dando voltas no quarteirão com boas jogadoras. No vôlei de praia, com treinamento, você pode se destacar’. Não sabia nem andar na areia e ainda levei um ano e meio para aceitar. No primeiro ano só passei de um qualifying. O segundo ‘click’ foi quando Jackie Silva me chamou para jogar e me mudei para o Rio de Janeiro. Eram duas pessoas que entendiam muito de vôlei de praia e apostavam em mim.
– Qual foi sua parceira mais habilidosa no vôlei de praia?
Joguei com quatro parceiras extremamente habilidosas: Renata, Maria Elisa, Taiana e Larissa, cada uma dentro de suas características. Todas faziam as coisas de maneira muito mais fácil do que eu. Renata tinha um controle de bola absurdo, Maria Elisa com um saque incrível e uma potência, Taiana habilidosíssima, defende como poucas, alcança bolas impossíveis e possui um toque perfeito. Mas Larissa talvez tenha sido a mais completa, fazia tudo muito bem, dominava todos os fundamentos. Mas não é só o talento natural, Larissa treinava muito e enxergava o jogo muito bem, por isso é uma das maiores da história do vôlei de praia.
– Qual foi sua maior emoção no vôlei de praia?
Acho que as maiores emoções são aquelas inéditas, quando você sente algo pela primeira vez. A primeira etapa de Circuito Mundial que ganhei, em 2005, ao lado da Renata. Foi em Atenas, um ano depois dos Jogos Olímpicos, onde Ricardo e Emanuel tinham feito história. No mesmo local. Aquilo me marcou demais, foi uma sensação extraordinária. E depois o primeiro jogo nos Jogos Olímpicos de Pequim, na minha primeira participação, quando ganhamos da dupla mexicana. Caiu a ficha de que estávamos na Olimpíada. As demais emoções você acaba dividindo com outros sentimentos, essas eu acredito que senti mais.
– Qual atleta você gostaria de ter tido como parceira?
Eu consegui jogar ao lado da Jackie Silva, que admirava muito. Nem acreditei quando ela me chamou para jogar com ela, vi ela ser campeã olímpica, era uma referência. E tive a oportunidade de conhecer a pessoa. A Jackie era aquela fortaleza, aquela mulher forte, mas é uma pessoa doce, engraçada. Foi um privilégio. Já a Shelda não consegui atuar junto dela. Foi minha adversária por um curto período. Pois adversário é quem você pode vencer, e isso só aconteceu após muitos anos. Antes, contra quem você só sofria ‘lavadas’, era apenas ídolo. Foi uma das maiores de todos os tempos. E lembro-me da primeira vez que venci ela, em 2005, na etapa de Bali (Indonésia) do Circuito Mundial. Sempre vou me lembrar. Meu avô até brincou “agora você ficou boa, ganhou da Shelda”.