Um capítulo sem igual da história do vôlei nacional completa 40 anos nesta quarta-feira (26/7). Escrito debaixo de muita chuva, com talento e emoção. Com quase 96 mil pessoas na arquibancada, as seleções masculinas de Brasil e União Soviética se enfrentaram em um palco inusitado, o Maracanã. O placar da vitória verde-amarela – 3 sets a 1 (14/16, 16/14, 15/7 e 15/10) – é menos lembrado do que as cenas de alguns dos maiores craques do esporte na época dando espetáculo embaixo de uma chuva torrencial. O impacto e a repercussão do evento tiveram reflexos na popularização do esporte. Depois daquele 26 de julho de 1983, o voleibol brasileiro nunca mais foi o mesmo.
A equipe brasileira que entrou em quadra naquela partida foi a base do grupo que conquistaria a prata nos Jogos de Los Angeles, em 1984, primeira medalha olímpica do vôlei nacional. Amauri, Badalhoca, Bernard, Bernardinho, Cacau, Domingos Maracanã, Fernandão, Léo Pasquali, Marcus Vinícius Freire, Montanaro, Ronaldo, Renan Dal Zotto, Rui Campos, Xandó e William protagonizaram momentos únicos no Maracanã. No comando do time, o inesquecível Bebeto de Freitas. “Foi um dia memorável para o vôlei brasileiro. Quatro décadas depois, não há fã de esporte que não conheça a história daquele jogo. O público, a chuva, a disposição dos jogadores das duas equipes em disputar a partida mesmo com toda a chuva que caía no Maracanã. Muitos conceitos do esporte estavam ali representados: talento, paixão, garra, superação, respeito. Foi um evento que impulsionou o crescimento do vôlei nacional. O trabalho que realizamos hoje tem reflexos daquele dia”, diz Radamés Lattari, presidente da Confederação Brasileira de Voleibol (CBV).
O confronto entre Brasil e União Soviética, organizado pela CBV em parceria com o jornalista Luciano do Valle, reeditava a final do Campeonato Mundial de 1982. Entre os jogadores, uma dúvida: será que os torcedores apoiariam a ideia de um jogo de vôlei no templo do futebol brasileiro? “Se fosse pouca gente, ia ficar muito claro, por causa do tamanho da arquibancada do Maracanã. No dia do jogo, essa era uma preocupação no vestiário. As informações chegavam aos poucos. ‘Acho que já chegaram umas 10 mil pessoas’, dizia um. ‘Acho que já passamos de 15 mil’, falava outro. Até que as informações pararam de chegar. E realmente não sabíamos quantas pessoas havia ali. Então começaram a chamar os jogadores. Quando chegou a minha vez, não acreditei no que vi quando entrei no gramado. Estava absolutamente lotado, as pessoas gritando, bandeiras enormes. Nunca vou esquecer esse momento. Por isso nos esforçamos tanto para jogar, da maneira que fosse. Nós mesmos secamos a quadra várias vezes. Não poderíamos decepcionar toda aquela gente”, relembra Renan Dal Zotto, hoje técnico da seleção brasileira masculina.
Com a chuva, os atletas chegaram a jogar só de meias e se mobilizaram para secar a quadra, que foi recoberta com carpetes para que o jogo pudesse continuar. Campeões olímpicos em 1980 e mundiais em 1982, os soviéticos também ficaram encantados com a grande presença de público. “Quando olhamos pelo túnel do vestiário, nós e os soviéticos, vislumbramos aquele mundo de gente. Tocou a todos nós, uma sensação maravilhosa”, conta Amauri, que além da prata em Los Angeles 1984 foi ouro em Barcelona 1992.
Fernandão lembra que até mesmo os craques do futebol se renderam ao evento. “Sou fanático por futebol e frequentava o Maracanã desde os 9 anos. Entrar no gramado, diante de 95 mil pessoas, foi uma realização. Foi algo que marcou essa geração e vamos carregar para sempre. Após a partida, o Zico foi nos cumprimentar no vestiário. Ele era um dos maiores da época e foi nos prestigiar. Até hoje encontro pessoas que estiveram no Maracanã e vêm falar comigo sobre o que viveram naquele dia”.
Criador do emblemático saque Jornada nas Estrelas, Bernard comemorou o fato se sua “invenção” poder ser usada sem as limitações impostas pelos tetos dos ginásios. “A seleção da União Soviética era praticamente imbatível. O impacto do jogo foi enorme. A torcida gritava ‘Jornada! Jornada! Jornada!’. Tinha até um bonequinho no placar eletrônico, que dava uma pancada na bola e ela dava a volta no globo terrestre”, conta Bernard. “Falar daquela partida, 40 anos depois, me comove. Foi um momento histórico. Fico feliz que este jogo seja sempre lembrado”.
O Banco do Brasil é o patrocinador oficial do voleibol brasileiro